OPINIÃO

As gravações originais de Taylor Swift sempre seriam melhores

Artista agora é dona de todo o seu catálogo — mas são as gravações originais que moldam seu legado musical

Larisha Paul - Rolling Stone EUA

Publicado em 06/06/2025, às 16h48
Taylor Swift em 2024 - Foto: Ashok Kumar TAS24 / Getty Images for TAS Rights Management
Taylor Swift em 2024 - Foto: Ashok Kumar TAS24 / Getty Images for TAS Rights Management

Nos filmes, uma das regras principais sobre viagem no tempo é: não faça nada que possa causar uma ruptura no contínuo espaço-tempo. Enredos que transitam entre passado, presente e futuro enfatizam a fragilidade das escolhas. Em 2021, Taylor Swift começou a construir uma realidade alternativa ao desmontar seus seis primeiros álbuns de estúdio e reaproveitá-los em um extenso processo de regravação para recuperar a posse de sua música. A pergunta passou a ser: “E se pudéssemos refazer tudo de novo — só que ainda maior?”

Com o apoio de uma base de fãs disposta a ir até os confins da terra com ela, Swift encarou um universo de possibilidades sem limites. Ela não foi a primeira artista a tentar recuperar a posse de suas músicas ao regravar tudo do zero — mas foi a primeira a fazer isso em uma escala monumental. Era mais do que apenas ter um catálogo cheio de discos que definiram épocas. Aquelas músicas se tornaram armas naquilo que ela considera ser a luta de sua vida.

Em 2019, sua antiga gravadora, Big Machine, vendeu as gravações originais de seus seis primeiros álbuns para Scooter Braun, que depois as revendeu para o fundo de investimentos Shamrock Holdings. Naquele momento, Swift não conseguia prever que o ciclo se fecharia com a Shamrock vendendo os álbuns de volta para ela. Ela só via vermelho

“Meu legado musical está prestes a cair nas mãos de alguém que tentou destruí-lo”, disse Swift quando a notícia da venda inicial veio à tona, em 2019.

As regravações começaram como uma missão elaborada para desvalorizar o catálogo original e mostrar que o verdadeiro valor daquelas músicas residia nela mesma. Ela adicionou as músicas do vault. Depois veio “All Too Well (10 Minute Version) (Taylor’s Version)”. Em seguida, a Eras Tour levou tudo a um novo patamar explosivo.

No fim das contas, Swift teve seu final feliz, e agora é dona de todas as músicas que já lançou. Mas a revelação do terceiro ato é que as gravações originais sempre seriam melhores do que suas contrapartes em Taylor’s Version. Cada detalhe daqueles lançamentos conta a história do legado que ela temia perder quando seu catálogo foi parar nas mãos erradas. E cada pequena mudança feita nas regravações reescreveu sua narrativa.

Algumas mudanças foram estruturais, mas, principalmente, estratégicas. Quando Fearless (Taylor’s Version) foi lançado como o primeiro álbum do projeto de regravações, veio acompanhado da música “If This Was a Movie (Taylor’s Version)”, que aparece como a quinta música no EP The More Fearless (Taylor’s Version). A versão original da canção havia sido lançada dois anos depois de Fearless. Com esse projeto, Swift reordenou o tempo simplesmente ao reorganizar a tracklist. 

Pelo que sabemos, a mudança não causou nenhum colapso multidimensional — mas ainda assim, foi algo diferente, e nada insignificante para uma artista que se dedica minuciosamente à ordem das músicas em seus álbuns. Essa era a Taylor’s Version. Ela estabeleceu o padrão do que esses álbuns regravados poderiam ser. Swift pôde reestruturar, reorganizar e revisar o passado como quisesse, com uma perspectiva que só conquistou anos depois do lançamento original desses discos.

“If This Was a Movie” é a única música da edição deluxe de Speak Now que credita um coautor: Martin Johnson, da banda Boys Like Girls. Quando Speak Now (Taylor’s Version) foi lançado, essa faixa bônus foi omitida e Swift declarou:

“Escrevi Speak Now completamente sozinha, entre os 18 e os 20 anos.”

Em 2010, ela compôs o álbum por conta própria para provar que nenhuma força externa era responsável por seu sucesso.

“As músicas que surgiram nesse período da minha vida foram marcadas por uma honestidade brutal, confissões diarísticas sem filtros e uma nostalgia selvagem”, ela disse.

“É um conto sobre amadurecer, tropeçar, voar, cair... e sobreviver para contar”.

E mesmo que aquele crédito único de coautoria nunca tenha diminuído seu feito, era uma ponta solta — e ela fez questão de amarrá-la.

Apesar de todo seu discurso sobre honestidade brutal e confissões sem filtro, Swift não resistiu à tentação de “limpar” algumas coisas no caminho. A mudança mais notável aconteceu em “Better Than Revenge (Taylor’s Version)”. A nova versão reescreve a frase:

“She’s better known for the things that she does on the mattress.” (“Ela é mais conhecida pelas coisas que faz no colchão.”)

Embora relativamente inofensiva para a época, a frase destoava da imagem da “doce garota do country-pop”. Mas sua remoção também apagou um contexto importante para compreender o legado de Swift no que diz respeito ao feminismo e à misoginia — um aspecto da sua narrativa que já inspirou cursos de gênero em universidades. Talvez, hoje, isso não pareça tão relevante, mas em determinado momento, essa foi a verdade dela.

Em Red (Taylor’s Version), Swift fez o oposto. A versão de 10 minutos de “All Too Well” tinha muito mais a dizer — não menos. Ainda é discutido se ela escreveu realmente o verso “fuck the patriarchy” naquela época ou se aquilo foi como refazer mentalmente uma briga com respostas melhores, muito tempo depois. Trazer o futuro para o passado seria trapaça? Talvez. Swift estava inventando as regras conforme avançava.

Quando Max Martin e alguns dos produtores originais de Red e 1989 não voltaram, ela mesma regravou as contribuições deles com Christopher Rowe e Jack Antonoff. Mas, assim como em Speak Now (Taylor’s Version), as escolhas de produção, por vezes confusas, enterraram boa parte da emoção intensa das versões originais.

Pode-se argumentar que isso não tem tanta importância. As versões originais ainda existem, afinal. Agora, os fãs podem criar playlists combinando suas faixas preferidas. No entanto, até Swift conseguir recomprar suas músicas, a ideia era que não haveria necessidade de voltar às originais.

 Porém, a partir de Fearless, conforme o som dela foi ficando mais complexo, ficou visivelmente mais difícil recriar o momento com cada novo relançamento. A voz dela mudou tanto quanto ela mesma. O sotaque country forçado se foi. Há um distanciamento emocional evidente em todo o catálogo revisado — uma distância entre o melodrama das lembranças e o filtro contido com que ela as enxerga hoje.

Como alguém que se comunica com seus fãs por meio de pistas escondidas e mensagens enigmáticas, Swift sabe o quanto os pequenos detalhes, aparentemente insignificantes, importam. Ela admitiu isso ao revelar que, no momento, tem menos de 25% de Reputation (Taylor’s Version) gravado. “O Reputation foi um álbum muito específico daquele momento da minha vida, e eu sempre travava quando tentava refazê-lo”, disse ela. “É o único álbum entre os seis primeiros que achei que não poderia ser melhorado ao ser refeito”. O trecho de “Look What You Made Me Do (Taylor’s Version)” que apareceu em um episódio de The Handmaid’s Tale prova seu ponto. É só um vislumbre, mas suficiente para justificar a necessidade de uma tábua ouija para entrar em contato com a Taylor antiga. Só ela conseguiria fazer direito.

Existe uma especificidade inegável na forma como Swift transmite emoção em todos os seus álbuns. É evidente quando ela está se esforçando demais — e também quando não está se esforçando o suficiente. Dá para ouvir isso nos sulcos mais profundos dos discos originais. Dá para sentir a ausência disso nas regravações.

A maior força de Swift como intérprete é que, quando ela canta algo, você tende a acreditar nela. Foi isso que tornou Reputation tão pessoal. O fato de que, naquela fase da carreira, ela estava tendo muita dificuldade para fazer as pessoas acreditarem nela, foi parte fundamental do disco. Como ela pode acessar de novo a sensação de ser a pessoa mais odiada do mundo — quando agora é, indiscutivelmente, uma das mais amadas? E por que ela faria isso?

A Eras Tour foi o único lugar onde a linha entre as gravações originais e as Taylor’s Versions simplesmente não existia. O público gritava de volta as músicas que mais significavam para eles — e tudo era o mesmo. Alguns só conheceram a música de Swift muito tempo após ser considerado “traição” ouvir as “versões roubadas”, como os fãs chamam as originais. Emoções que para ela já estão desgastadas podem ser completamente novas para eles. Essa é a versão deles. Outros convivem com essas letras há anos — e sabem exatamente o que está faltando quando ouvem as novas versões no carro ou nos fones de ouvido.

Nos filmes, esse seria o momento em que os créditos começariam a subir, e Swift cantaria: “Nothing’s gonna change, not for me and you”. Qual versão você ouve?

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