JULGAMENTO

Promotora do caso Diddy diz que 'é hora de justiça' em argumentação final

'É o reino dele', disse um promotor sobre Combs. 'Todos estavam lá para servi-lo'

Cheyenne Roundtree e Nancy Dillon

Publicado em 27/06/2025, às 17h41
Sean "Diddy" Combs - Foto: MEGA/GC Images
Sean "Diddy" Combs - Foto: MEGA/GC Images

Sean "Diddy" Combs agiu como um poderoso chefão no topo de uma conspiração criminosa que usava violência, silêncio e “vergonha” para prender duas mulheres em episódios de tráfico sexual, nos quais elas não tinham escolha a não ser realizar atos sexuais sob efeito de drogas com acompanhantes masculinos, para satisfazer as fantasias voyeuristas dele, disse uma promotora federal aos jurados nesta quinta-feira. As informações são da Rolling Stone.

Durante os argumentos finais no julgamento de Combs por tráfico sexual e conspiração para formação de quadrilha, a promotora assistente dos EUA Christy Slavik guiou os jurados pelas cinco acusações criminais contra o magnata da música — alvo de um julgamento altamente acompanhado que já dura sete semanas, no sul de Manhattan. Slavik chamou Combs de “líder de uma organização criminosa” que se recusava a aceitar um “não” como resposta e sempre conseguia o que queria.

“O réu era um homem muito poderoso, mas se tornou ainda mais poderoso e perigoso por causa do apoio de seu círculo íntimo e de seus negócios — a organização”, disse Slavik. Ela afirmou que Combs deixava claro para suas supostas vítimas que contava com uma equipe de segurança “armada e pronta” para protegê-lo de qualquer ameaça percebida.

“É o reino dele”, disse Slavik sobre Combs. “Todos estavam ali para servi-lo.”

Reunindo o caso do governo após semanas de depoimentos por vezes desconexos, Slavik explicou aos jurados que Combs pode ser considerado culpado de conspiração para formação de quadrilha se eles determinarem que ele e pelo menos um suposto cúmplice concordaram com a prática de dois dos oito chamados “atos primários” listados na acusação. Esses atos podem incluir duas instâncias do mesmo crime, como distribuição de drogas, suborno, incêndio criminoso, sequestro, tráfico sexual, trabalho forçado, intimidação de testemunhas ou transporte para fins de prostituição.

Slavik detalhou cuidadosamente os depoimentos relacionados a cada uma dessas opções, incluindo o episódio em que Combs supostamente entregou um suborno de US$ 100 mil em dinheiro a um segurança de hotel, acreditando que ele possuía a única cópia de uma filmagem de segurança que mostrava Combs agredindo Cassie Ventura no hotel InterContinental, em Los Angeles, em março de 2016. Ela disse que o trabalho forçado pode incluir as “exaustivas” maratonas sexuais que Combs supostamente obrigou sua ex-namorada Casandra “Cassie” Ventura e outra ex-namorada — que depôs sob o pseudônimo “Jane” — a suportar por vários dias em quartos de hotel escuros.

Slavik também esclareceu que Combs pode ser considerado culpado de tráfico sexual se os jurados concluírem que ele coagiu as mulheres a praticarem pelo menos um ato sexual não consentido com um acompanhante masculino pago. “Não se trata de tudo ou nada”, enfatizou. Ela afirmou que não importa se, em algum momento anterior, as mulheres demonstraram entusiasmo com os encontros. Se houve apenas “uma situação” em que Ventura ou Jane se sentiram coagidas a participar de um “freak off” (orgias organizadas por Combs), por meio de “força, ameaças, fraude ou coerção”, isso já é suficiente, disse Slavik. “Sr. Combs deve ser considerado culpado de tráfico sexual.”

Ao fim de sua apresentação, que durou quase cinco horas, Slavik afirmou que Combs cometeu “crime após crime” ao longo de duas décadas — e deve responder por isso.

“É hora de responsabilizá-lo. É hora de justiça”, concluiu. “É hora de declarar o réu culpado.”

A defesa fará sua argumentação final nesta sexta-feira, antes da réplica do governo. O júri começará as deliberações na segunda-feira.

O fundador da Bad Boy Records, de 55 anos, que pode pegar prisão perpétua se for condenado, declarou-se inocente das acusações de conspiração para formação de quadrilha, duas acusações de tráfico sexual e duas de transporte para fins de prostituição. (Os advogados de Combs alegam que os relacionamentos dele podem ter sido “tóxicos” e, às vezes, fisicamente abusivos, mas não criminosos.)

Na quinta-feira, os assentos reservados para a família de Sean Combs no tribunal estavam ocupados por sua mãe, três filhos e suas três filhas mais velhas. Nos dias finais do julgamento, Combs parecia satisfeito com o desempenho de sua equipe jurídica estrelada — algo evidente nos abraços que deu aos advogados após eles encerrarem a defesa em apenas 25 minutos na terça-feira. Mas o início dos argumentos finais teve um tom visivelmente diferente. Combs parecia nervoso, tentando firmar as mãos enquanto servia um copo de água. Ele permaneceu praticamente imóvel, olhando para frente e lançando olhares ocasionais para o júri.

Falando aos jurados enquanto os familiares de Combs assistiam, a promotora Christy Slavik destacou os depoimentos emocionados de Cassie Ventura e da mulher identificada como “Jane”, que relataram ter se sentido “obrigadas” a participar — e às vezes facilitar — encontros sexuais com acompanhantes masculinos para agradar Combs. Slavik afirmou que o próprio Combs pagava os acompanhantes e, por vezes, os transportava de um lado ao outro do país para participar das maratonas sexuais que duravam dias. As mulheres diziam reconhecer essas noites altamente degradantes e induzidas por drogas como algo recorrente: Ventura as chamava de “freak offs”, e Jane se referia a elas como “noites de hotel” e “depravação”.

Slavik afirmou que a violência doméstica foi um dos fatores principais na forma como Combs coagiu Ventura para mantê-la sob seu controle e continuar atendendo às suas fantasias sexuais. Para Ventura, a ideia de que sofreria represálias por qualquer ato de resistência — seja por meio de agressões físicas ou ameaças de divulgação de vídeos íntimos — se tornou sua “nova normalidade”.

“Isso virou o trabalho dela”, disse Slavik, referindo-se às exigências de Combs para que Ventura usasse saltos altíssimos, se cobrisse de óleo de bebê, fizesse sexo com desconhecidos por dias seguidos e depois passasse o restante da semana se recuperando dos efeitos das drogas. “Virou sua vergonha.”

A promotora afirmou que Combs esperava “obediência total” e, caso não a obtivesse, reagia com agressividade. “Ela sabia que, quando ele estava feliz, ela estava segura”, disse Slavik. “Se o réu queria um ‘freak off’, ele ia acontecer.”

Slavik citou uma viagem de Jane a Nova York em 2023, inicialmente recusada porque ela não queria participar de um freak off. Ela acabou cedendo após Combs prometer um fim de semana romântico. Mas mensagens de texto mostraram que, sem o conhecimento de Jane, Combs já organizava um freak off para aquela noite. Slavik afirmou que ele a “enganou”, puxando “o tapete debaixo de seus pés”. “Antes mesmo do avião pousar”, disse a promotora, “isso já configura um ato consumado de tráfico sexual”.

Slavik também destacou um episódio em junho do ano passado, quando Combs supostamente agrediu Jane — a enforcando, chutando e socando — e a forçou a participar de outro freak off. Segundo o depoimento dela, ao protestar, Combs chegou a sussurrar: “Isso é coerção?”, numa suposta provocação cínica ao saber que já estava sendo investigado por tráfico sexual envolvendo Ventura. Para Slavik, isso foi Combs “zombando” de Jane e “admitindo descaradamente que estava quebrando a mesma lei que já havia violado várias vezes”.

Em sua argumentação, Slavik afirmou que Combs coagiu Ventura e Jane por meio de ameaças, violência, e ao impedir que elas trabalhassem, tornando-as financeiramente dependentes dele. Disse também que ele as drogava para que não conseguissem resistir. Segundo Slavik, um Combs de 37 anos se aproveitou da ingenuidade de Ventura, então com 19 e aspirante a cantora, moldando-a para os freak offs dentro de uma relação com uma dinâmica de poder profundamente desigual.

Ela afirmou ainda que Ventura reconhecia que Combs era perigoso para outras pessoas. Ventura teria presenciado Combs agredindo seu amigo Deonte Nash quando ele tentou defendê-la, e também estava presente no dia em que ele supostamente pendurou a estilista Bryana Bongolan pela sacada do 17º andar. Ventura também sabia que Combs pagou sua amiga Kerry Morgan após supostamente tê-la enforcado e arremessado um cabide de madeira em sua cabeça. (Os três amigos confirmaram os ataques em seus depoimentos.)

Os promotores disseram ainda que Ventura sabia que Combs invadiu a casa do rapper Kid Cudi com uma arma e o ameaçou de morte. Combs também teria dito a Ventura que planejava explodir o carro do artista. Dias depois, o Porsche de Kid Cudi explodiu em sua garagem, em plena luz do dia. “Claro que foi o réu por trás disso”, disse Slavik.

Slavik explicou aos jurados que a suposta organização criminosa de Combs era separada de seu império empresarial bilionário e público. A quadrilha operava nas sombras, conhecida apenas por um grupo restrito e bem pago de cúmplices. Um exemplo: Kristina Khorram, chefe de gabinete, recebia um salário de US$ 600 mil por ano, segundo a promotora.

Ela afirmou que os 34 testemunhos apresentados pelo governo comprovaram além de qualquer dúvida razoável que, sempre que o relacionamento de Combs com Ventura ou Jane estava em crise ou ameaçava se tornar público, ele e seus aliados faziam o que fosse necessário para manter o controle e evitar escândalos. A defesa afirma que Combs comprou o vídeo do hotel apenas para proteger sua reputação, mas Slavik argumenta que esse objetivo também servia para proteger sua organização.

Embora os advogados de defesa não tenham apresentado testemunhas, centraram os contra-interrogatórios em desacreditar os principais testemunhos da promotoria e destacar que Combs supostamente mantinha sua vida sexual separada dos negócios.

Mas os promotores alegam que, mesmo que ele tentasse esconder a contratação de acompanhantes masculinos, vários funcionários — além do círculo íntimo — viram homens nus saindo às pressas de quartos de hotel, desconhecidos entrando tarde da noite na suíte de Combs e Ventura, ou vídeos explícitos de Jane fazendo sexo com um homem enquanto Combs assistia. “Se todas essas pessoas perceberam, não faz sentido que seus cúmplices não soubessem”, disse Slavik.

Alguns funcionários disseram saber da propensão de Combs à violência. Um ex-assistente afirmou que, após presenciar uma briga entre Combs e uma namorada identificada como Gina, decidiu pedir demissão. No entanto, muitos relataram que trabalhar para o magnata era tão envolvente que eles acabavam isolados e insensibilizados, acreditando que sair da “família Bad Boy” — considerada por muitos um emprego dos sonhos — seria um erro grave.

Os promotores afirmam que os seguranças e até Khorram enviavam sinais contraditórios, fazendo os funcionários acreditarem que tinham aliados e que as coisas melhorariam. Mas, segundo Slavik, tanto os seguranças quanto Khorram eram leais a Combs. Ela lembrou aos jurados que Khorram supostamente vigiava Ventura a mando do chefe e ajudou a intermediar a compra do vídeo do hotel.

Slavik concluiu lembrando ao júri da disposição extrema de Combs de usar violência e medo “para conseguir o que queria” em qualquer situação. “Ele não aceita um ‘não’ como resposta”, disse. “Até hoje, o réu conseguiu escapar dessas acusações graças ao seu dinheiro, poder e influência. Isso acaba agora.”

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